quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Surto

Quer ver um obsessivo-compulsivo surtar? Após duas sessões semanais de terapia, deixe-o duas semanas sem terapia; esconda sua medicação para ansiedade no meio da bagunça de um ambiente onde ele é obrigado a conviver (here comes the trick), mas o dê a impressão de que ele pode e deve organizá-lo; deixe um objeto que lhe é importante sob posse de uma pessoa com a qual ele não tem intimidade para cobrá-lo insistentemente de volta; arranje um envolvimento com outra pessoa de cunho pessoal/ sentimental sem resolução definitiva (pessoa com a qual ele também não tem intimidade); mas para tudo isso ele tem o desafio (proposto em terapia) de “não se importar” com nada disso. Ser blasé. How THA FUCK is that possible?
Ok, assumo, este não é um surto legítimo, é apenas um pequeno lapso, em um surto legítimo eu não estaria desperdiçando segundos escrevendo, eu provavelmente estaria ligando de madrugada para a secretária do meu terapeuta; tomando o resto de Ritalina da minha minha roomate, just to ingest something with a Black cute “ribbon” on it; virando a noite para colocar todas as minhas roupas em caixas e malas empilhadas no canto do quarto para otimizar espaço e liberar piso visível para passar um paninho com água sanitária no chão, paredes e maçanetas da casa; estaria perseguindo quem sumiu com minha armação preferida de óculos (ok, eu que os  esqueci lá), como uma louca obsessiva-comp... nevermind; estaria mandando e-mails e mensagens de texto deixando bem claro que se não se quer nada comigo, eu definitivamente não vou querer mesmo, apesar de possessa, no tom (fracassado) mais blasé possível; e voltaria para a terapia dizendo: ”creio que não pude, devido a falta de ferramentas que me foram disponibilizadas até o momento, cumprir esta etapa de engrandecimento pessoal com êxito”. Em seguida engoliria o choro e me penitenciaria até me envolver em outro ciclo de atividades “cotidianas” para todo individuo são, mas que se tornam uma maratona, para quem se importa mais do que precisa com os detalhes, a sequência e o controle de execução.
Não se faz idéia do que se passa na cabeça de uma pessoa com certo grau de compulsão a execução de uma rotina social “cotidiana”, quanto se supõe, antevê e planeja até que as coisas aconteçam de fato, para daí, quase que invariavelmente ver-se que era tudo um grande exagero, as coisas acontecem de maneira mais simples, as pessoas não se importam tanto assim e a frustração em relação à mediocridade dos demais e, principalmente, em relação à consciência de se ter ido longe demais em relação a planos e conclusões, toma conta de todos os seus pensamentos, a imobiliza. A pipoca pula, pula, ferve, sozinha na panela, até que para e murcha, vagarosa e depressivamente.
Como se pode ter uma vida normal e pensar em tudo o que se tem que fazer e o que se quer fazer quando dentro de uma única pessoa tem todo um universo e uma linha do tempo dinâmica e retro-alimentável, que mescla passado, presente, expectativas e diversas possibilidades de resultado, com cada um dos indivíduos a sua volta – pois com poucos se tem a intimidade de preservar-lhe o livre-arbítrio, sem lhe exigir algum grau de submissão ao controle inerente ao comportamento obsessivo –, ainda assim, sem importunar as pessoas, afastá-las de seu convívio (não permitir que o abandone) e, ainda pior que isso, não se achar... mmmh, qual é a palavra mesmo? Me foge... LOUCA?
Ainda não encontrei nada próximo do utópico meio-termo. Já estou pegando ojeriza desta expressão. Prefiro a morte a ter que ser blasé, mas só consigo me comportar de maneira blasé, para não se afastarem de mim, para que não conheçam o que tenho escondido aqui. Mas estou apesar de tudo (todos os problemas que invento), me permitindo ser menos blasé e abrindo-me a manifestações criativas as quais me faz muito feliz, me dão forças para ignorar a opinião alheia (oh!). Assim, quando a ignoro, não sinto necessidade de controlá-la, conseqüentemente, não preciso policiar meu próprio comportamento, me sinto uma zona, uma bagunça física, emocional e comportamental, ainda insatisfeita, mas mais perto de ser feliz de ser quem se quer ser. Sim, cada dia mais feliz de assumir que sou esta merda, esta zona, onde nada presta, mas fuck’em, I’ll do it anyway. Wow, vou escrever uma letra de música com tudo isso e mandar num e-mail para o Renato Russo no além (já que ele tem mais chances de lançar algo que quem está vivo, né, Di?) e outro para um cover do Sex Pistols (já que o próprio, pardon mon français, CAGARIA para o meu e-mail). Em seguida vejo quem escreve a versão mais convincente da expressão dos MEUS sentimentos, quem me propõe cortar os pulsos de maneira mais lúdica (acho hilária essa palavra).
C’est ça! Ainda por cima estou em prova, deveria estar comendo livros digo, estudando.
Boa noite, Chantal. É, como em meu querido diário, você, figura anônima de desabafo vai ter nome e sim, ele será o da protagonista do livre que acabei de ler. Está fácil, quem chuta qual é?

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